Processo n.º 232/24.6T8STR.E1
*
Pressupostos da declaração de insolvência.
Factos-índice.
*
AAA requereu a declaração de
insolvência de Sociedade 1, alegando factos que, no seu entendimento, integram
o fundamento previsto no artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE.
A requerida deduziu oposição
ao pedido de insolvência, considerando-o manifestamente infundado.
Na sequência da realização
da audiência final, foi proferida sentença julgando a acção improcedente.
O requerente interpôs
recurso de apelação da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto da
sentença do tribunal a quo que
indeferiu o pedido de declaração de insolvência da recorrida Sociedade 1.
b) O tribunal a quo desrespeitou os valores legais das provas ao concluir que o
recorrente não fez prova da sua qualidade de credor como, ainda que assim não
fosse, que a recorrida não se encontra em situação de insolvência.
c) Quanto à prova da sua qualidade de
credor, o recorrente satisfez o exigido legalmente, nos termos do artigo 458.º
do Cód. Civil, na medida em que sendo portador de uma confissão de dívida efectuada
pela recorrida, autenticada notarialmente, juntou a mesma, nada mais lhe sendo
exigível.
d) Tem sido jurisprudência constante que
no processo executivo (e a insolvência é um processo executivo) a junção do
documento autêntico a formalizar a confissão de dívida preenche o ónus da prova
dos elementos constitutivos do seu crédito que, por isso, fica satisfeito com a
simples apresentação de tal documento.
e) Por outro lado, é pacífico na
doutrina que os documentos autênticos são títulos executivos quando deles
conste o reconhecimento, pelo devedor, duma obrigação pré-existente, como
acontece, designadamente, desde que haja uma confissão do facto constitutivo ou
um reconhecimento da dívida.
f) Na confissão de dívida junta aos
autos, a recorrida confessou-se devedora e os prazos ali estabelecidos para o
pagamento da dívida encontram-se ultrapassados, pelo que inexiste a menor
dúvida quanto à qualidade de credor do recorrente.
g) É certo que a recorrida podia ter
ilidido a presunção da existência da dívida, mas o certo é que não só não
alegou a pertinente factualidade, logo não se pode ter por provada, como não é
por se ter provado que uma filha do devedor apresentou uma denúncia contra
terceiros, invocando, pasme-se, «burla de
elevado valor económico», que se afasta a presunção legal.
h) Nem tampouco afasta a referida presunção
o facto da referida denúncia ter dado lugar a inquérito, pois isso é uma
consequência legal uma vez que nos termos do artigo 262.º n.º 2 do CPP a
notícia de um crime dá sempre lugar à abertura do inquérito.
i) Regressando à jurisprudência, veja-se
que a mesma é unânime que por força da inversão do ónus da prova, à executada
não bastava instalar a dúvida sobre a existência da relação fundamental, havia
que alegar, para poder vir a demonstrar, factos que permitissem concluir pela
inexistência da relação fundamental. Ora,
j) Para que a recorrida pudesse ver
afastada a presunção iuris tantum da
sua confissão de dívida haveria de alegar factos naturalísticos pretéritos ou
coevos à sua declaração que, existindo, pudessem ter viciado a sua vontade,
como o dolo, o erro ou a coação.
k) Uma denúncia criminal (que pode
preencher os elementos de denúncia caluniosa) é um expediente que, mesmo que
manipulado por advogado, não substitui a aqui necessária alegação e prova dos
respetivos factos naturalísticos realizadores do pedaço de vida em causa.
l) O tribunal a quo errou quando afirmou que «…nenhuma
prova foi feita quanto à existência da mesma…», pois a verdade é que a
confissão de dívida é, até prova em contrário, prova plena de que a requerida
se confessou devedora da quantia de € 260.000,00.
m) E essa prova em contrário, ao invés
do que julgou o tribunal a quo, não
se pode cingir a declarações de parte em que é transmitida uma mera
desconfiança em relação ao negócio das convenientemente investidas gerentes –
note-se: após a confissão de dívida – aliada à idade avançada do declarante
devedor cuja capacidade intelecto-volitiva não foi posta em causa em momento
algum.
n) Com resguardo na doutrina
referenciada nas alegações inovamos ainda que a confissão feita nos articulados
pelo mandatário da parte e aceite pela contraparte, de forma expressa, clara e
inequívoca, nos termos e para os efeitos dos artigos 47.º e 465.º, n.º 2, ambos
do Código de Processo Civil, adquire força probatória plena contra o
confitente, nos termos do artigo 358.º, n.º 1 do Código Civil, como modalidade
de confissão judicial escrita.
o) E o certo é que a recorrida, pela
pena do seu mandatário, confessou a existência da dívida, afirmando no artigo
16.º da sua oposição que «Assim, o único
facto real – alegado pelo requerente – é existência de um documento denominado
“confissão de dívida”, onde está escrito que BBB, “por si e em nome da sua
representada”, isto é, a requerida, confessa uma determinada dívida.».
p) Não tendo sido feito prova da
falsidade do declarado na confissão de dívida, a mesma é plena e eficaz e o
recorrente é legítimo credor podendo exigir o pagamento à recorrente. Posto
isto,
Quanto à situação de insolvência:
q) O que verdadeiramente caracteriza a
situação de insolvência de uma empresa é a falta de liquidez para cumprir com
as suas obrigações, ou seja, até pode ter um vasto património imobiliário, mas
se não tiver liquidez seja por que motivo for não deixa por isso de estar
insolvente.
r) O crédito do recorrente é bastante
elevado e a recorrida recorre a vários expedientes para não só não o pagar como
dissimular a sua carência de meios económicos e financeiros para o solver, pelo
que se cria a presunção iuris tantum
de insolvência plasmada no artigo 20.º n.º 1 al. b) do CIRE, presunção esta que
não foi afastada até porque em momento algum a recorrida alegou que tem
liquidez suficiente ou meios de a adquirir de imediato para solver a sua
obrigação.
s) Veja-se que, como decorre da alegada
denúncia criminal, a recorrida debate-se com falta de liquidez, tanto assim que
ali é alegado que para financiar os seus negócios (bons ou maus não são contas
do nosso rosário) terá recorrido a terceiros não banqueiros para financiar os
seus negócios.
t) Está ali expressis verbis denomine dito que «…Sr. BBB começou a solicitar empréstimos junto de várias pessoas,
entre as quais a sua irmã (CCC) e as suas filhas, DDD e EEE.»
u) Portanto, se a recorrida tivesse
liquidez suficiente para os seus compromissos certamente que não teria de se
socorrer de empréstimos particulares.
v) Aplica-se ao caso sub judice, a jurisprudência de que a
devedora não cumpre o ónus de contrariar a presunção de insolvência quando não
demonstra factos que comprovem, apesar da mesma, a sua solvência, maxime quando dos que se julgam assentes
resulta que esta se encontra incapaz de satisfazer um simples crédito vencido,
do credor requerente.
w) E ainda a jurisprudência de que até
pode haver situação líquida positiva e o requerido estar em situação de
insolvência, se se verificar que a falta de crédito não lhe permite superar a
carência de liquidez para cumprir as suas obrigações vencidas.
x) Por todo o exposto a sentença
recorrida violou o disposto no artigo 458.º n.º 1 do Código Civil e nos artigos
3.º n.º 1 e 20.º n.º 1 al. b) do CIRE, devendo estas normas serem interpretadas
e aplicadas no sentido expresso nas conclusões deste recurso.
Os factos julgados provados
na sentença recorrida são os seguintes:
1. A Sociedade 1, com o NIPC (…), sede
na Rua (…), 2330 Entroncamento, foi criada em 25.11.1981, tendo por objecto
social a indústria de construção civil, e um capital social de 50.000,00 Euros.
2. Era seu gerente BBB, obrigando-se a
sociedade apenas com a assinatura do mesmo.
3. Em data não apurada, o gerente da
devedora, BBB, «por si, e na qualidade de
sócio e gerente, em representação da sociedade comercial por quotas Sociedade 1»,
confessou-se, por meio de declaração escrita, com Termo de Autenticação de
15-12-2023 emitido pelo Cartório Notarial da Dra. (…), da importância de
duzentos e sessenta mil euros a AAA, «(…)
e que já procedeu ao pagamento do montante de sessenta mil euros, no dia 27 de
novembro de 2023 e o remanescente será pago até 15 de janeiro de 2024.»,
tendo AAA aceite a confissão de dívida.
4. Em 2024.01.22 foram inscritas
diversas alterações no registo da sociedade, passando a constar que a mesma se
obriga com a assinatura de um gerente em actos de mero expediente; e nos demais
actos, obriga-se com as assinaturas conjuntas:
a) Do gerente BBB, e de qualquer outro
gerente; ou
b) Das gerentes EEE e DDD.
5. Na mesma data foi inscrita a nomeação
das gerentes EEE e DDD.
6. Ao reformar a gerência, a requerida
pretendeu não só rejuvenescer o exercício de tal função, como desanuviar o
trabalho de BBB, que ainda exercia solitariamente a gerência.
7. BBB nasceu em 21.08.1936.
8. Em 24.01.2024 foi instaurada a
vertente acção.
9. Em 2024.02.02 foi inscrito o depósito
da prestação de contas individual de 2022.
10. Em data não apurada, mas seguramente
anterior a 16.02.2024, DDD apresentou participação criminal na Polícia
Judiciária (queixa eletrónica n.º 2024/166) por factos suscetíveis de
consubstanciar burla de elevado valor económico tendo por vítimas BBB e a
requerida, e como suspeitos o requerente e outros.
11. Dessa denúncia consta,
designadamente «18. No dia 15 de dezembro,
o Sr. AAA, convenceu o Sr. BBB a dirigir-se com ele ao Cartório Notarial de
forma a celebrar um documento por Termo de Autenticação, que lhe permitisse
manter em vigor o contrato promessa de compra e venda dos lotes de Fátima, cujo
prazo terminou em 05.03.2023, dizendo-lhe que se lhe pagasse até 15 de janeiro
de 2024 o remanescente do preço no valor de €200.000,00, ainda podia recomprar
os lotes de Fátima.
12. Nessa
data, o Sr. BBB desconhecia que os imóveis já haviam sido alienados a
terceiros, pelo que se dirigiu confiante ao Cartório Notarial de Vila Nova da
Barquinha com o Sr. AAA e assinou um documento intitulado «Confissão de Dívida»
(doc 19), nos termos do qual o Sr. BBB declarou que se confessava devedor ao
Sr. AAA da quantia de € 260.000,00, da qual já havia pago o valor de € 60.000,00,
pelo que o valor ascendia a € 200.000,00, que deveriam ser pagos até
15.01.2024. O Sr. BBB estava desesperado e continuava a acreditar no Sr. AAA.»
13. Em resultado da referida
participação criminal, corre termos na Procuradoria da República da Comarca de
Santarém, Departamento de Investigação e Acção Penal – 3.ª Secção de Santarém,
o inquérito n.º 307/24.1T9STR por factos suscetíveis de integrar a eventual prática
de crime de burla qualificada em que é ofendido BBB e Sociedade 1 e suspeitos FFF,
GGG, AAA, Sociedade 2.
14. Em 2024.02.22 foi inscrita a
alteração do nome da requerida para Sociedade 1-A, a alteração da sua sede para
(…), 1990 - 213 Lisboa.
15. A sociedade requerida debateu-se, há
uns anos, com problemas de liquidez.
16. A requerida é proprietária de mais
de 30 imóveis, nomeadamente:
a. Prédio urbano sito em (…), que tem
valor comercial aproximado de € 150.000,00;
b. Prédio urbano sito em (…), que tem
valor comercial aproximado de € 125.000,00;
c. Prédio urbano em (…), que tem valor
comercial aproximado de € 800.000,00.
17. O imóvel situado em (…) foi objecto
de estudo de mercado pela Century21 em 14 de fevereiro de 2024, sendo avaliado
em aproximadamente € 5.000.000.
18. Muitos dos imóveis da requerida
estão arrendados, sendo pagas rendas mensais pelos mesmos.
19. Nos últimos seis meses, a requerida
tem pago as remunerações laborais aos seus trabalhadores tempestivamente.
20. A requerida tem a sua situação
tributária regularizada.
21. A requerida tem as seguintes ações
pendentes contra si: execução ordinária n.º 2526/20.0T8ENT; acção de processo
comum n.º 498/16.5T8TMR e embargos de executado n.º 1706/07.9TBVNO-D.
22. A requerida indicou como únicas
dívidas:
a. Dívida de € 25.000 (vinte e cinco mil
euros) ao Banco Montepio;
b. Dívida de € 6.427,36 (seis mil
quatrocentos e vinte e sete euros e trinta e seis cêntimos) à Schindler, SA.
23. Quanto ao crédito do Banco Montepio
sobre a requerida, a requerida havia celebrado com aquela instituição bancária,
em 10 de Agosto de 2020, um empréstimo de € 50.000 (cinquenta mil euros), que
vencerá em 10 de agosto de 2026, mensalmente amortizável com prestações de €
946,36 (novecentos e quarenta e seis euros e trinta e seis cêntimos), que se
encontram em dia e estão regularizadas, restando por montante total da dívida €
25.000,05 (vinte mil e cinco cêntimos).
24. A requerida apresentou a declaração
anual de Informação Empresarial Simplificada em 22 de Março de 2024, reportada
ao período de 1 de Janeiro de 2023 a 31 de Dezembro de 2023, resultando da
mesma que:
a. O total do passivo da requerida era
de € 1.655.866,43;
b. O total do activo da requerida era de
€ 1.757.514,71;
25. Em 27 de Março de 2024, a requerida
regularizou a sua situação junto à secção do processo executivo de Santarém do
Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P:
a. No processo n.º 1401202300204340,
procedendo ao pagamento de € 6.400,10;
b. No processo n.º 1401202300053392,
procedendo ao pagamento de € 36,59;
c. No processo n.º 1401202300145246,
procedendo ao pagamento de € 229,80;
d. No processo n.º 1401202400010308,
procedendo ao pagamento de € 7.396,80.
Os factos julgados não
provados na sentença recorrida são os seguintes:
a) A requerida é devedora de €
200.000,00 ao requerente.
b) Após o vencimento do crédito, o requerente
tentou obter o pagamento junto de BBB, o que se mostrou impossível.
c) Quer a requerida, quer BBB, não
dispõem de liquidez suficiente para tal pagamento.
d) A requerida não contabiliza todos os
seus custos.
e) E empola os seus activos.
f) A requerida não paga na data de
vencimento os respectivos créditos a diversos credores.
g) A requerida tem atrasado os
pagamentos à Segurança Social.
*
O tribunal a quo julgou a acção improcedente com
dois fundamentos, considerando que qualquer deles era, por si só, suficiente
para esse efeito. O primeiro foi a falta de prova, por parte do recorrente, da
existência do direito de crédito invocado na petição inicial. O segundo foi a não
verificação do facto indiciário de insolvência previsto no artigo 20.º, n.º 1,
al. b), do CIRE.
O recorrente ataca ambos.
Por um lado, considera que o tribunal a
quo, ao concluir que ele não fez prova da sua qualidade de credor, violou o
disposto nos artigos 47.º e 465.º, n.º 2, do CPC, e 358.º, n.º 1, e 458.º do
Código Civil. Por outro, sustenta que o tribunal a quo violou o disposto no artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE, ao
concluir que a requerida não se encontra em situação de insolvência.
A circunstância de o recorrente não ter impugnado a decisão proferida pelo tribunal a quo sobre a matéria de facto, de acordo com a qual ficou «não provado» que «A requerida é devedora de € 200.000,00 ao requerente» [al. a)], não é impeditiva da discussão da questão de saber se o crédito invocado na petição inicial existe. Isto porque, tendo essa questão uma natureza puramente jurídica, não é susceptível de um juízo de prova. A existência de uma relação jurídica creditória entre o recorrente (como sujeito activo) e a recorrida (como sujeito passivo) constitui, não um facto susceptível de prova, mas sim uma conclusão jurídica a que, em face dos factos provados e das normas jurídicas aplicáveis, poderá, ou não, chegar-se. Consequentemente, a al. a) do enunciado dos factos não provados terá de ser considerada não escrita, ficando, assim, em aberto a questão de saber se o recorrente é credor da recorrida.
O efeito prático desta conclusão é o de que o recurso não poderá ser julgado improcedente com o exclusivo fundamento de ter sido julgado não provado que a recorrida deva € 200.000 ao recorrente. Para poder concluir-se pela improcedência do recurso, terá de se chegar a uma de duas conclusões jurídicas: ou que o recorrente não é credor da recorrida, ou que não se verificam os pressupostos da declaração desta última como insolvente.
Optamos pela segunda via de
fundamentação. Mesmo admitindo que o recorrente seja titular do direito de
crédito que invoca contra a recorrida, consideramos manifesta a não verificação
dos pressupostos da declaração de insolvência.
Recordemos que o recorrente
requereu a declaração de insolvência da recorrida alegando factos que, no seu
entendimento, integram a previsão do artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE: falta
de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas
circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor
satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.
A matéria de facto provada
não permite concluir que a recorrida se encontre nesta situação.
Mesmo admitindo que a
recorrida deva a quantia de € 200.000 ao recorrente e que tal dívida se
encontre vencida, essa hipotética situação de mora não indicia que a primeira
se encontre impossibilitada de satisfazer a generalidade das suas obrigações.
Tanto assim é, que aquilo que se verifica em relação à generalidade das
obrigações da recorrida é o cumprimento por parte desta.
É certo que a recorrida se
debateu com problemas de liquidez há alguns anos. Todavia, tudo indica que tais
problemas estão ultrapassados. O pagamento de salários encontra-se em dia, a situação
tributária encontra-se regularizada e não são devidas contribuições à segurança
social. De acordo com a declaração anual de Informação Empresarial Simplificada
relativa ao ano de 2023, o activo e o passivo da recorrida eram,
respectivamente, de € 1.757.514,71 e € 1.655.866,43. A recorrida é proprietária
de mais de 30 imóveis, tendo três deles os valores de € 150.000, € 125.000 e €
800.000. Muitos desses imóveis são rentabilizados através da celebração de
contratos de arrendamento. Nestas circunstâncias, o facto de a recorrida ter
pendentes, contra si, as acções descritas no n.º 21, não tem qualquer
significado.
Nada indicia, portanto, que
a recorrida se encontre numa situação de impossibilidade de satisfazer
pontualmente a generalidade das suas obrigações.
Nas alegações de recurso, o
recorrente insiste na afirmação de que a recorrida tem falta de liquidez e, por
essa razão, se encontra impossibilitada de satisfazer as suas obrigações,
nomeadamente de pagar a dívida que tem para consigo, no montante de € 200.000.
Invoca, como fundamento, o teor da denúncia criminal descrita nos n.ºs 10 a 12,
do qual, no seu entendimento, decorre que a recorrida se debate «com falta de liquidez, tanto assim que ali
é alegado que para financiar os seus negócios (…) terá recorrido a terceiros
não banqueiros para financiar os seus negócios» (…). Considera o recorrente
que, «se a recorrida tivesse liquidez
suficiente para os seus compromissos certamente que não teria de se socorrer de
empréstimos particulares».
O recorrente não tem razão.
A matéria de facto com base
na qual a causa tem de ser decidida é aquela que consta do enunciado dos factos
provados. Como vimos anteriormente, essa matéria inculca, não que a recorrida
tenha problemas de falta de liquidez, mas precisamente o contrário, pois vem
cumprindo a generalidade das suas obrigações, nomeadamente para com os seus
colaboradores, a administração fiscal e a segurança social.
O crédito que o recorrente
invoca não foi pago. Porém, tanto quanto resulta do enunciado dos factos
provados, a razão dessa falta de pagamento é a existência de um litígio entre o
recorrente e a recorrida sobre a existência desse crédito (litígio esse a
resolver em sede diversa de uma acção de insolvência), nada tendo a ver com uma
hipotética falta de liquidez por parte da segunda, que, patentemente, não se
verifica.
Concluindo, não existe
fundamento para declarar a insolvência da recorrida. O tribunal a quo decidiu acertadamente ao julgar a
acção improcedente.
*
Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto,
julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo do
recorrente.
Notifique.
*
Évora, 25.10.2024
Vítor Sequinho dos Santos (relator)
(1.º adjunto)
(2.ª adjunta)