quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Acórdão da Relação de Évora de 25.10.2024

Processo n.º 232/24.6T8STR.E1

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Pressupostos da declaração de insolvência.

Factos-índice.

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AAA requereu a declaração de insolvência de Sociedade 1, alegando factos que, no seu entendimento, integram o fundamento previsto no artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE.

A requerida deduziu oposição ao pedido de insolvência, considerando-o manifestamente infundado.

Na sequência da realização da audiência final, foi proferida sentença julgando a acção improcedente.

O requerente interpôs recurso de apelação da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:

a) Vem o presente recurso interposto da sentença do tribunal a quo que indeferiu o pedido de declaração de insolvência da recorrida Sociedade 1.

b) O tribunal a quo desrespeitou os valores legais das provas ao concluir que o recorrente não fez prova da sua qualidade de credor como, ainda que assim não fosse, que a recorrida não se encontra em situação de insolvência.

c) Quanto à prova da sua qualidade de credor, o recorrente satisfez o exigido legalmente, nos termos do artigo 458.º do Cód. Civil, na medida em que sendo portador de uma confissão de dívida efectuada pela recorrida, autenticada notarialmente, juntou a mesma, nada mais lhe sendo exigível.

d) Tem sido jurisprudência constante que no processo executivo (e a insolvência é um processo executivo) a junção do documento autêntico a formalizar a confissão de dívida preenche o ónus da prova dos elementos constitutivos do seu crédito que, por isso, fica satisfeito com a simples apresentação de tal documento.

e) Por outro lado, é pacífico na doutrina que os documentos autênticos são títulos executivos quando deles conste o reconhecimento, pelo devedor, duma obrigação pré-existente, como acontece, designadamente, desde que haja uma confissão do facto constitutivo ou um reconhecimento da dívida.

f) Na confissão de dívida junta aos autos, a recorrida confessou-se devedora e os prazos ali estabelecidos para o pagamento da dívida encontram-se ultrapassados, pelo que inexiste a menor dúvida quanto à qualidade de credor do recorrente.

g) É certo que a recorrida podia ter ilidido a presunção da existência da dívida, mas o certo é que não só não alegou a pertinente factualidade, logo não se pode ter por provada, como não é por se ter provado que uma filha do devedor apresentou uma denúncia contra terceiros, invocando, pasme-se, «burla de elevado valor económico», que se afasta a presunção legal.

h) Nem tampouco afasta a referida presunção o facto da referida denúncia ter dado lugar a inquérito, pois isso é uma consequência legal uma vez que nos termos do artigo 262.º n.º 2 do CPP a notícia de um crime dá sempre lugar à abertura do inquérito.

i) Regressando à jurisprudência, veja-se que a mesma é unânime que por força da inversão do ónus da prova, à executada não bastava instalar a dúvida sobre a existência da relação fundamental, havia que alegar, para poder vir a demonstrar, factos que permitissem concluir pela inexistência da relação fundamental. Ora,

j) Para que a recorrida pudesse ver afastada a presunção iuris tantum da sua confissão de dívida haveria de alegar factos naturalísticos pretéritos ou coevos à sua declaração que, existindo, pudessem ter viciado a sua vontade, como o dolo, o erro ou a coação.

k) Uma denúncia criminal (que pode preencher os elementos de denúncia caluniosa) é um expediente que, mesmo que manipulado por advogado, não substitui a aqui necessária alegação e prova dos respetivos factos naturalísticos realizadores do pedaço de vida em causa.

l) O tribunal a quo errou quando afirmou que «…nenhuma prova foi feita quanto à existência da mesma…», pois a verdade é que a confissão de dívida é, até prova em contrário, prova plena de que a requerida se confessou devedora da quantia de € 260.000,00.

m) E essa prova em contrário, ao invés do que julgou o tribunal a quo, não se pode cingir a declarações de parte em que é transmitida uma mera desconfiança em relação ao negócio das convenientemente investidas gerentes – note-se: após a confissão de dívida – aliada à idade avançada do declarante devedor cuja capacidade intelecto-volitiva não foi posta em causa em momento algum.

n) Com resguardo na doutrina referenciada nas alegações inovamos ainda que a confissão feita nos articulados pelo mandatário da parte e aceite pela contraparte, de forma expressa, clara e inequívoca, nos termos e para os efeitos dos artigos 47.º e 465.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil, adquire força probatória plena contra o confitente, nos termos do artigo 358.º, n.º 1 do Código Civil, como modalidade de confissão judicial escrita.

o) E o certo é que a recorrida, pela pena do seu mandatário, confessou a existência da dívida, afirmando no artigo 16.º da sua oposição que «Assim, o único facto real – alegado pelo requerente – é existência de um documento denominado “confissão de dívida”, onde está escrito que BBB, “por si e em nome da sua representada”, isto é, a requerida, confessa uma determinada dívida.».

p) Não tendo sido feito prova da falsidade do declarado na confissão de dívida, a mesma é plena e eficaz e o recorrente é legítimo credor podendo exigir o pagamento à recorrente. Posto isto,

Quanto à situação de insolvência:

q) O que verdadeiramente caracteriza a situação de insolvência de uma empresa é a falta de liquidez para cumprir com as suas obrigações, ou seja, até pode ter um vasto património imobiliário, mas se não tiver liquidez seja por que motivo for não deixa por isso de estar insolvente.

r) O crédito do recorrente é bastante elevado e a recorrida recorre a vários expedientes para não só não o pagar como dissimular a sua carência de meios económicos e financeiros para o solver, pelo que se cria a presunção iuris tantum de insolvência plasmada no artigo 20.º n.º 1 al. b) do CIRE, presunção esta que não foi afastada até porque em momento algum a recorrida alegou que tem liquidez suficiente ou meios de a adquirir de imediato para solver a sua obrigação.

s) Veja-se que, como decorre da alegada denúncia criminal, a recorrida debate-se com falta de liquidez, tanto assim que ali é alegado que para financiar os seus negócios (bons ou maus não são contas do nosso rosário) terá recorrido a terceiros não banqueiros para financiar os seus negócios.

t) Está ali expressis verbis denomine dito que «…Sr. BBB começou a solicitar empréstimos junto de várias pessoas, entre as quais a sua irmã (CCC) e as suas filhas, DDD e EEE.»

u) Portanto, se a recorrida tivesse liquidez suficiente para os seus compromissos certamente que não teria de se socorrer de empréstimos particulares.

v) Aplica-se ao caso sub judice, a jurisprudência de que a devedora não cumpre o ónus de contrariar a presunção de insolvência quando não demonstra factos que comprovem, apesar da mesma, a sua solvência, maxime quando dos que se julgam assentes resulta que esta se encontra incapaz de satisfazer um simples crédito vencido, do credor requerente.

w) E ainda a jurisprudência de que até pode haver situação líquida positiva e o requerido estar em situação de insolvência, se se verificar que a falta de crédito não lhe permite superar a carência de liquidez para cumprir as suas obrigações vencidas.

x) Por todo o exposto a sentença recorrida violou o disposto no artigo 458.º n.º 1 do Código Civil e nos artigos 3.º n.º 1 e 20.º n.º 1 al. b) do CIRE, devendo estas normas serem interpretadas e aplicadas no sentido expresso nas conclusões deste recurso.

Os factos julgados provados na sentença recorrida são os seguintes:

1. A Sociedade 1, com o NIPC (…), sede na Rua (…), 2330 Entroncamento, foi criada em 25.11.1981, tendo por objecto social a indústria de construção civil, e um capital social de 50.000,00 Euros.

2. Era seu gerente BBB, obrigando-se a sociedade apenas com a assinatura do mesmo.

3. Em data não apurada, o gerente da devedora, BBB, «por si, e na qualidade de sócio e gerente, em representação da sociedade comercial por quotas Sociedade 1», confessou-se, por meio de declaração escrita, com Termo de Autenticação de 15-12-2023 emitido pelo Cartório Notarial da Dra. (…), da importância de duzentos e sessenta mil euros a AAA, «(…) e que já procedeu ao pagamento do montante de sessenta mil euros, no dia 27 de novembro de 2023 e o remanescente será pago até 15 de janeiro de 2024.», tendo AAA aceite a confissão de dívida.

4. Em 2024.01.22 foram inscritas diversas alterações no registo da sociedade, passando a constar que a mesma se obriga com a assinatura de um gerente em actos de mero expediente; e nos demais actos, obriga-se com as assinaturas conjuntas:

a) Do gerente BBB, e de qualquer outro gerente; ou

b) Das gerentes EEE e DDD.

5. Na mesma data foi inscrita a nomeação das gerentes EEE e DDD.

6. Ao reformar a gerência, a requerida pretendeu não só rejuvenescer o exercício de tal função, como desanuviar o trabalho de BBB, que ainda exercia solitariamente a gerência.

7. BBB nasceu em 21.08.1936.

8. Em 24.01.2024 foi instaurada a vertente acção.

9. Em 2024.02.02 foi inscrito o depósito da prestação de contas individual de 2022.

10. Em data não apurada, mas seguramente anterior a 16.02.2024, DDD apresentou participação criminal na Polícia Judiciária (queixa eletrónica n.º 2024/166) por factos suscetíveis de consubstanciar burla de elevado valor económico tendo por vítimas BBB e a requerida, e como suspeitos o requerente e outros.

11. Dessa denúncia consta, designadamente «18. No dia 15 de dezembro, o Sr. AAA, convenceu o Sr. BBB a dirigir-se com ele ao Cartório Notarial de forma a celebrar um documento por Termo de Autenticação, que lhe permitisse manter em vigor o contrato promessa de compra e venda dos lotes de Fátima, cujo prazo terminou em 05.03.2023, dizendo-lhe que se lhe pagasse até 15 de janeiro de 2024 o remanescente do preço no valor de €200.000,00, ainda podia recomprar os lotes de Fátima.

12. Nessa data, o Sr. BBB desconhecia que os imóveis já haviam sido alienados a terceiros, pelo que se dirigiu confiante ao Cartório Notarial de Vila Nova da Barquinha com o Sr. AAA e assinou um documento intitulado «Confissão de Dívida» (doc 19), nos termos do qual o Sr. BBB declarou que se confessava devedor ao Sr. AAA da quantia de € 260.000,00, da qual já havia pago o valor de € 60.000,00, pelo que o valor ascendia a € 200.000,00, que deveriam ser pagos até 15.01.2024. O Sr. BBB estava desesperado e continuava a acreditar no Sr. AAA.»

13. Em resultado da referida participação criminal, corre termos na Procuradoria da República da Comarca de Santarém, Departamento de Investigação e Acção Penal – 3.ª Secção de Santarém, o inquérito n.º 307/24.1T9STR por factos suscetíveis de integrar a eventual prática de crime de burla qualificada em que é ofendido BBB e Sociedade 1 e suspeitos FFF, GGG, AAA, Sociedade 2.

14. Em 2024.02.22 foi inscrita a alteração do nome da requerida para Sociedade 1-A, a alteração da sua sede para (…), 1990 - 213 Lisboa.

15. A sociedade requerida debateu-se, há uns anos, com problemas de liquidez.

16. A requerida é proprietária de mais de 30 imóveis, nomeadamente:

a. Prédio urbano sito em (…), que tem valor comercial aproximado de € 150.000,00;

b. Prédio urbano sito em (…), que tem valor comercial aproximado de € 125.000,00;

c. Prédio urbano em (…), que tem valor comercial aproximado de € 800.000,00.

17. O imóvel situado em (…) foi objecto de estudo de mercado pela Century21 em 14 de fevereiro de 2024, sendo avaliado em aproximadamente € 5.000.000.

18. Muitos dos imóveis da requerida estão arrendados, sendo pagas rendas mensais pelos mesmos.

19. Nos últimos seis meses, a requerida tem pago as remunerações laborais aos seus trabalhadores tempestivamente.

20. A requerida tem a sua situação tributária regularizada.

21. A requerida tem as seguintes ações pendentes contra si: execução ordinária n.º 2526/20.0T8ENT; acção de processo comum n.º 498/16.5T8TMR e embargos de executado n.º 1706/07.9TBVNO-D.

22. A requerida indicou como únicas dívidas:

a. Dívida de € 25.000 (vinte e cinco mil euros) ao Banco Montepio;

b. Dívida de € 6.427,36 (seis mil quatrocentos e vinte e sete euros e trinta e seis cêntimos) à Schindler, SA.

23. Quanto ao crédito do Banco Montepio sobre a requerida, a requerida havia celebrado com aquela instituição bancária, em 10 de Agosto de 2020, um empréstimo de € 50.000 (cinquenta mil euros), que vencerá em 10 de agosto de 2026, mensalmente amortizável com prestações de € 946,36 (novecentos e quarenta e seis euros e trinta e seis cêntimos), que se encontram em dia e estão regularizadas, restando por montante total da dívida € 25.000,05 (vinte mil e cinco cêntimos).

24. A requerida apresentou a declaração anual de Informação Empresarial Simplificada em 22 de Março de 2024, reportada ao período de 1 de Janeiro de 2023 a 31 de Dezembro de 2023, resultando da mesma que:

a. O total do passivo da requerida era de € 1.655.866,43;

b. O total do activo da requerida era de € 1.757.514,71;

25. Em 27 de Março de 2024, a requerida regularizou a sua situação junto à secção do processo executivo de Santarém do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P:

a. No processo n.º 1401202300204340, procedendo ao pagamento de € 6.400,10;

b. No processo n.º 1401202300053392, procedendo ao pagamento de € 36,59;

c. No processo n.º 1401202300145246, procedendo ao pagamento de € 229,80;

d. No processo n.º 1401202400010308, procedendo ao pagamento de € 7.396,80.

Os factos julgados não provados na sentença recorrida são os seguintes:

a) A requerida é devedora de € 200.000,00 ao requerente.

b) Após o vencimento do crédito, o requerente tentou obter o pagamento junto de BBB, o que se mostrou impossível.

c) Quer a requerida, quer BBB, não dispõem de liquidez suficiente para tal pagamento.

d) A requerida não contabiliza todos os seus custos.

e) E empola os seus activos.

f) A requerida não paga na data de vencimento os respectivos créditos a diversos credores.

g) A requerida tem atrasado os pagamentos à Segurança Social.

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O tribunal a quo julgou a acção improcedente com dois fundamentos, considerando que qualquer deles era, por si só, suficiente para esse efeito. O primeiro foi a falta de prova, por parte do recorrente, da existência do direito de crédito invocado na petição inicial. O segundo foi a não verificação do facto indiciário de insolvência previsto no artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE.

O recorrente ataca ambos. Por um lado, considera que o tribunal a quo, ao concluir que ele não fez prova da sua qualidade de credor, violou o disposto nos artigos 47.º e 465.º, n.º 2, do CPC, e 358.º, n.º 1, e 458.º do Código Civil. Por outro, sustenta que o tribunal a quo violou o disposto no artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE, ao concluir que a requerida não se encontra em situação de insolvência.

A circunstância de o recorrente não ter impugnado a decisão proferida pelo tribunal a quo sobre a matéria de facto, de acordo com a qual ficou «não provado» que «A requerida é devedora de € 200.000,00 ao requerente» [al. a)], não é impeditiva da discussão da questão de saber se o crédito invocado na petição inicial existe. Isto porque, tendo essa questão uma natureza puramente jurídica, não é susceptível de um juízo de prova. A existência de uma relação jurídica creditória entre o recorrente (como sujeito activo) e a recorrida (como sujeito passivo) constitui, não um facto susceptível de prova, mas sim uma conclusão jurídica a que, em face dos factos provados e das normas jurídicas aplicáveis, poderá, ou não, chegar-se. Consequentemente, a al. a) do enunciado dos factos não provados terá de ser considerada não escrita, ficando, assim, em aberto a questão de saber se o recorrente é credor da recorrida.

O efeito prático desta conclusão é o de que o recurso não poderá ser julgado improcedente com o exclusivo fundamento de ter sido julgado não provado que a recorrida deva € 200.000 ao recorrente. Para poder concluir-se pela improcedência do recurso, terá de se chegar a uma de duas conclusões jurídicas: ou que o recorrente não é credor da recorrida, ou que não se verificam os pressupostos da declaração desta última como insolvente.

Optamos pela segunda via de fundamentação. Mesmo admitindo que o recorrente seja titular do direito de crédito que invoca contra a recorrida, consideramos manifesta a não verificação dos pressupostos da declaração de insolvência.

Recordemos que o recorrente requereu a declaração de insolvência da recorrida alegando factos que, no seu entendimento, integram a previsão do artigo 20.º, n.º 1, al. b), do CIRE: falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.

A matéria de facto provada não permite concluir que a recorrida se encontre nesta situação.

Mesmo admitindo que a recorrida deva a quantia de € 200.000 ao recorrente e que tal dívida se encontre vencida, essa hipotética situação de mora não indicia que a primeira se encontre impossibilitada de satisfazer a generalidade das suas obrigações. Tanto assim é, que aquilo que se verifica em relação à generalidade das obrigações da recorrida é o cumprimento por parte desta.

É certo que a recorrida se debateu com problemas de liquidez há alguns anos. Todavia, tudo indica que tais problemas estão ultrapassados. O pagamento de salários encontra-se em dia, a situação tributária encontra-se regularizada e não são devidas contribuições à segurança social. De acordo com a declaração anual de Informação Empresarial Simplificada relativa ao ano de 2023, o activo e o passivo da recorrida eram, respectivamente, de € 1.757.514,71 e € 1.655.866,43. A recorrida é proprietária de mais de 30 imóveis, tendo três deles os valores de € 150.000, € 125.000 e € 800.000. Muitos desses imóveis são rentabilizados através da celebração de contratos de arrendamento. Nestas circunstâncias, o facto de a recorrida ter pendentes, contra si, as acções descritas no n.º 21, não tem qualquer significado.

Nada indicia, portanto, que a recorrida se encontre numa situação de impossibilidade de satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.

Nas alegações de recurso, o recorrente insiste na afirmação de que a recorrida tem falta de liquidez e, por essa razão, se encontra impossibilitada de satisfazer as suas obrigações, nomeadamente de pagar a dívida que tem para consigo, no montante de € 200.000. Invoca, como fundamento, o teor da denúncia criminal descrita nos n.ºs 10 a 12, do qual, no seu entendimento, decorre que a recorrida se debate «com falta de liquidez, tanto assim que ali é alegado que para financiar os seus negócios (…) terá recorrido a terceiros não banqueiros para financiar os seus negócios» (…). Considera o recorrente que, «se a recorrida tivesse liquidez suficiente para os seus compromissos certamente que não teria de se socorrer de empréstimos particulares».

O recorrente não tem razão.

A matéria de facto com base na qual a causa tem de ser decidida é aquela que consta do enunciado dos factos provados. Como vimos anteriormente, essa matéria inculca, não que a recorrida tenha problemas de falta de liquidez, mas precisamente o contrário, pois vem cumprindo a generalidade das suas obrigações, nomeadamente para com os seus colaboradores, a administração fiscal e a segurança social.

O crédito que o recorrente invoca não foi pago. Porém, tanto quanto resulta do enunciado dos factos provados, a razão dessa falta de pagamento é a existência de um litígio entre o recorrente e a recorrida sobre a existência desse crédito (litígio esse a resolver em sede diversa de uma acção de insolvência), nada tendo a ver com uma hipotética falta de liquidez por parte da segunda, que, patentemente, não se verifica.

Concluindo, não existe fundamento para declarar a insolvência da recorrida. O tribunal a quo decidiu acertadamente ao julgar a acção improcedente.

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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas a cargo do recorrente.

Notifique.

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Évora, 25.10.2024

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

(1.º adjunto)

(2.ª adjunta)


Acórdão da Relação de Évora de 30.01.2025

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