terça-feira, 26 de março de 2024

Acórdão da Relação de Évora de 19.03.2024

Processo n.º 56/14.9TBMAC.E1 – Insolvência

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Sumário:

1 – Os recursos ordinários visam o reexame de questões que foram submetidas à apreciação do tribunal a quo e não o conhecimento de questões novas.

2 – Os credores são notificados da proposta de distribuição e de rateio final através da publicação desta na Área de Serviços Digitais dos Tribunais. O prazo para os credores se pronunciarem sobre aquela proposta conta-se a partir da data desta publicação.

3 – Tendo a sentença de graduação dos créditos reclamados qualificado o crédito da recorrente como subordinado, a proposta de distribuição e de rateio final não poderá deixar de reflectir tal qualificação e o tribunal não poderá alterar a mesma qualificação no momento processual previsto no n.º 4 do artigo 182.º do CIRE.

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Insolvente:

Sociedade 1, Lda..

Credora/recorrente:

Maria de Lurdes.

Decisão recorrida:

«Nada tendo sido reclamado relativamente à proposta de distribuição e rateio final apresentada, e atenta a concordância da secretaria, deverão os pagamentos ser efetuados em conformidade.

Consigna-se, para os efeitos tidos por convenientes, que nos termos do art. 183º/3 do CIRE, não sendo o cheque apresentado a pagamento (ou comunicado o NIB para efeitos de transferência bancária) no prazo de um ano contado desde a data do aviso ao credor, prescreve o crédito respetivo e reverte a quantia a favor do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I.P.

Uma vez efetuada a conta e realizado o rateio final, importa declarar encerrado o processo nos termos do art. 230º/1-a do CIRE, em que é insolvente Sociedade 1, Lda..

Encerrado o processo após o rateio final, cessam as atribuições da comissão de credores e do administrador da insolvência.

Com o registo do encerramento do processo, a sociedade considera-se extinta – art. 234º/3, CIRE.

Excetuados os processos de verificação de créditos, qualquer ação que corra por dependência do processo de insolvência e cuja instância não se extinga, deve ser conclusa para efeitos de desapensação do processo e remessa para o tribunal competente.

As execuções fiscais apensas deverão ser todas devolvidas à Administração Fiscal.

Nos 10 dias posteriores ao encerramento, o administrador da insolvência deve entregar no tribunal, para arquivo, toda a documentação relativa ao processo que se encontre em seu poder, bem como os elementos da contabilidade do devedor que não hajam de ser restituídos ao próprio.

Notifique para o efeito.

Registe, publicite e notifique art. 230º/2, CIRE.»

Conclusões do recurso:

1) Os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor não poderão ser considerados como créditos subordinados sempre que beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais.

2) A recorrente exerceu funções de operadora de máquina no estabelecimento da Insolvente entre 02/11/1993 e 21/03/2014.

3) A recorrente é titular de um crédito privilegiado (privilégios imobiliário e mobiliário geral) sobre a insolvente, reclamado nos autos.

4) Os privilégios creditórios do crédito da recorrente sobre a insolvente constam da lista de credores.

5) Os créditos laborais de todos os trabalhadores identificados nos autos foram reconhecidos como créditos privilegiados, (privilégio imobiliário especial e mobiliário geral) a ser pagos em 1.º lugar pelo produto da liquidação das verbas n.º 1 a 16 (bens móveis) e pelo produto da liquidação da verba n.º 18 (bem imóvel), correspondente às instalações da Insolvente.

6) No mapa de rateio final o crédito da trabalhadora, ora recorrente, foi excluído da lista de credores a serem pagos pelo produto da(s) liquidação(s).

7) Com a sentença ora recorrida, a credora tomou conhecimento da proposta de rateio e distribuição do produto da liquidação.

8) A sentença ora recorrida determina a realização dos pagamentos em conformidade com a proposta de distribuição de rateio final apresentada.

9) O tribunal tem o poder-dever de verificar a conformidade substancial e forma dos títulos de créditos constantes da lista e/ou mapas de rateio, a fim de evitar a violação da lei substantiva.

10) Iguais exigências se impõem ao abrigo dos princípios da prevalência da verdade material sobre a formal, bem como da igualdade entre credores, independentemente da existência de impugnações do mapa de rateio final.

11) Nos autos, o crédito detido pela recorrente, apesar de pessoa especialmente relacionada com a devedora, como crédito laboral que é, goza de privilégio imobiliário especial e privilégio mobiliário geral, pelo que deve o mesmo ser pago, em primeiro lugar, pelo produto da liquidação das verbas 1 a 16 e 18.

12) Posto isto, existem motivos para não ser realizado o rateio final em conformidade com a proposta de distribuição e rateio final apresentada.

13) Por cautela de patrocínio, identificada que foi a natureza e o montante do crédito da recorrente e privilégios inerentes, verdadeiramente o que está em causa, é a interpretação feita do dispositivo, reduzindo-se as dúvidas ora suscitadas a mero erro de interpretação/material.

14) Assim sendo, e salvo o devido respeito, o tribunal a quo não deveria ter determinado o pagamento dos credores nos termos do rateio apresentado.

15) Tal distribuição e pagamento constituem violação da lei substantiva (artigos conjugados 47.º, n.º 4, al. b), 48.º, al. a), 49.º, n.º 2, alíneas a) e d) conjugadas com a alínea b) do n.º1 e 97.º do CIRE), do princípio da verdade material sobre a verdade meramente formal e do princípio da igualdade entre os credores, consagrado nos artigos 604.º, n.º 1 do CC e 194º, n.º 1 do CIRE.

16) Por não ter decido dest’arte, ao decretar o pagamento dos credores conforme mapa de rateio (excluído o crédito privilegiado da recorrente), violou a douta decisão as normas dos artigos 47.º, n.º 4, al.b), 48.º, 49.º e 97.º do CIRE e artigo 737.º, n.º 1, al. d) do CC, bem como os princípios da verdade material que norteia o nosso processo.

Factos relevantes para a decisão do recurso:

1 – Da sentença proferida no apenso de verificação e graduação de créditos, consta o seguinte:

«(…)

Nos presentes autos, como decorre da lista apresentada pelo Sr. Administrador da Insolvência, foram reconhecidos créditos privilegiados, garantidos, comuns e subordinados.

Aqui chegados, cumpre identificar as classes dos créditos sobre a massa insolvente reconhecidos pelo AI:

a) Privilegiados:

- Créditos laborais, que gozam de privilégio imobiliário especial sobre a verba nº 18 e mobiliário geral, de todos os trabalhadores identificados na lista, pelos montantes aí indicados, e que aqui se dão por integralmente reproduzidos;

- Créditos do FGS, no valor de 64 489,62 €, que gozam de privilégio imobiliário especial sobre a verba nº 18 e mobiliário geral;

- Créditos do ISS, IP, no valor de € 48.303,77 com privilégio imobiliário e mobiliário geral;

- Créditos da AT, a título de IMI, IS e IMT no valor total de € 11.850,10, com privilégio imobiliário especial sobre a verba nº 18;

- Créditos da AT a título de IRS e IRC, no valor de € 7.502,91, com privilégio imobiliário e mobiliário geral;

- Créditos da AT a título de IVA, no valor de € 18.997,56, com privilégio mobiliário geral;

b) Garantidos:

- Créditos do Banco 1, S.A., no valor de € 73.454,73, garantido por hipoteca registada sobre a verba nº 18;

c) Comuns:

- Todos os demais reconhecidos, devidamente identificados como comuns na lista apresentada pelo AI.

d) Subordinados:

- Todos os demais reconhecidos, devidamente identificados como subordinados na lista apresentada pelo AI.

Os créditos laborais gozam de privilégio imobiliário especial e mobiliário geral (art. 333º do C.T.) e são pagos à frente dos créditos por impostos e da Segurança Social – art. 747º, 749º do CC e Ac. TRG de 13-2-2014, proc. nº 1216/13.5TBBCL-A.G1 – bem como dos créditos garantidos por hipoteca.

(…)

Em seguida, devem ser pagos os créditos comuns, na proporção respetiva, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral – art. 47º, n.º 4, alínea c) e art. 176º CIRE.

Os créditos subordinados são os últimos a obter pagamento.

(…)

IV- Decisão

Atendendo a tudo o que ficou exposto supra, deve proceder-se ao pagamento dos créditos, através do produto da massa insolvente, pela seguinte ordem:

1º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda de cada bem móvel ou imóvel, conforme estipula o n.º 1 e 2 do art. 172º CIRE;

2.º - Do remanescente, serão pagos, atendendo ao auto de apreensão junto em 20-4-2021:

Relativamente ao produto da liquidação das verbas nº 1 a 16 (bens móveis)

1º lugar: créditos laborais, e créditos do FGS, com privilégio mobiliário geral, rateadamente se necessário;

2º lugar: créditos da AT a título de IVA, IRC e IRS e créditos do ISS, IP, com privilégio mobiliário geral, rateadamente se necessário;

3º lugar: créditos comuns;

4º lugar: créditos subordinados.

Relativamente ao produto da liquidação das verbas nº 17, 19 e 20 (bens imóveis)

1º lugar: créditos do ISS, IP, com privilégio imobiliário geral;

2º lugar: créditos da AT a título de IRC e IRS, com privilégio imobiliário geral;

3º lugar: créditos comuns;

4º lugar: créditos subordinados

Relativamente ao produto da liquidação da verba nº 18 (bem imóvel)

1º lugar: créditos laborais e do FGS, com privilégio imobiliário especial, rateadamente, se necessário;

2º lugar: créditos da AT, a título de IS, IMT e IMI, com privilégio imobiliário especial;

3º lugar: créditos do Banco 1, S.A., garantidos por hipoteca;

4º lugar: créditos do ISS, IP, com privilégio imobiliário geral;

5º lugar: créditos da AT a título de IRC e IRS, com privilégio imobiliário geral;

6º lugar: créditos comuns;

7º lugar: créditos subordinados.»

2 – Não foi interposto recurso da sentença referida em 1, encontrando-se a mesma transitada em julgado;

3 – Na relação de créditos reconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência no apenso de verificação e graduação de créditos, é atribuída a natureza de subordinado ao crédito de que a recorrente é titular;

4 – A proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência não prevê o pagamento, sequer parcial, do crédito de que a recorrente é titular;

5 – O montante a ratear é insuficiente para o pagamento integral dos créditos não subordinados que foram reconhecidos;

6 – A proposta de distribuição e de rateio final foi publicada na Área de Serviços Digitais dos Tribunais;

7 – Nenhum credor se pronunciou sobre a proposta de distribuição e de rateio final.

Questão a decidir:

Admissibilidade do conhecimento da questão suscitada pela recorrente em sede de recurso.

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A recorrente sustenta que o direito de crédito de que é titular, por ter natureza laboral e ser garantido por privilégios imobiliário e mobiliário geral, não pode ser qualificado como subordinado e, com esse fundamento, excluído da lista de créditos a serem pagos pelo produto da liquidação, como aconteceu. Em vez disso, segundo a recorrente, o seu direito de crédito deve ter tratamento idêntico aos dos restantes trabalhadores, ou seja, deve ser qualificado como privilegiado, (privilégio imobiliário especial e mobiliário geral) e pago em primeiro lugar pelo produto da liquidação das verbas n.ºs 1 a 16 (bens móveis) e da verba n.º 18 (bem imóvel), correspondente às instalações da insolvente. A recorrente afirma que só com a notificação da sentença recorrida, que determina a realização dos pagamentos em conformidade com a proposta de distribuição de rateio final, tomou conhecimento desta.

O n.º 3 do artigo 182.º do CIRE estabelece que, após julgadas as contas e paga a conta de custas, no prazo de 10 dias, o administrador da insolvência apresenta, no processo, proposta de distribuição e de rateio final, acompanhada da respectiva documentação de suporte caso seja diferente daquela que já existe no processo, e procede à publicação da proposta na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, dispondo a comissão de credores, caso tenha sido nomeada, e os credores, de 15 dias, contados desde a data da publicação, para se pronunciarem sobre a mesma.

Resulta desta norma que os credores são notificados da proposta de distribuição e de rateio final através da publicação desta na Área de Serviços Digitais dos Tribunais. O prazo para os credores se pronunciarem sobre aquela proposta conta-se a partir da data desta publicação.

Daí que não seja exacta a afirmação, feita pela recorrente, de que não foi notificada da proposta de distribuição e de rateio final. Tal notificação foi realizada através da publicação da proposta na Área de Serviços Digitais dos Tribunais.

Tendo a recorrente deixado decorrer o prazo legal para se pronunciar sobre a proposta de distribuição e de rateio final, ficou precludido o direito de o fazer. Consequentemente, está vedado, à recorrente, invocar uma suposta ilegalidade da proposta através da interposição de recurso da decisão que ordenou a realização dos pagamentos em conformidade com ela. Apenas poderia fazê-lo, em princípio, perante o tribunal a quo, dentro do prazo acima referido. Dizemos em princípio porque, tendo em conta o fundamento invocado pela recorrente, nem sequer no momento processual previsto na parte final do n.º 3 do artigo 182.º do CIRE ela estava a tempo de o fazer. Adiante justificaremos esta afirmação.

O tribunal a quo, naturalmente, não se pronunciou, na decisão recorrida, sobre a questão que a recorrente suscita perante o tribunal ad quem, pois a mesma não lhe foi colocada. Estamos, pois, perante uma questão nova. Ora, resulta dos artigos 627.º, n.º 1, 639.º, n.ºs 1 e 2 e 640.º do CPC que os recursos ordinários visam o reexame de questões que foram submetidas à apreciação do tribunal a quo e não o conhecimento de questões novas, ou seja, suscitadas pela primeira vez perante o tribunal ad quem. Isto, naturalmente, sem prejuízo do conhecimento, por este último, das questões que o devam ser oficiosamente, o que não é o caso daquela que a recorrente agora suscita. “Os recursos são meios de obter a reforma de sentença injusta, de sentença inquinada de vício substancial ou de erro de julgamento. (…) pretende-se um novo exame da causa, por parte de órgão jurisdicional hierarquicamente superior.”[1] Esta é uma regra básica em matéria de recursos, que define a própria natureza destes.

Isto basta para julgar o recurso improcedente, pois nenhuma outra questão é suscitada pela recorrente.

Não obstante, passamos a justificar a conclusão, acima enunciada, de que, tendo em conta o fundamento invocado pela recorrente, nem sequer no momento processual previsto na parte final do n.º 3 do artigo 182.º do CIRE ela estava a tempo de o fazer. 

O fundamento invocado pela recorrente para pôr em causa a proposta de distribuição e de rateio final é a natureza do direito de crédito de que é titular. Considera a recorrente que esse crédito deve ser qualificado, não como subordinado, mas sim com privilegiado.

Ora, a questão da natureza do crédito da recorrente foi decidida pela sentença de graduação dos créditos reclamados, da qual não foi interposto recurso e que, consequentemente, se encontra transitada em julgado. Nessa sentença, o tribunal a quo, mediante remissão para o conteúdo da relação de créditos reconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência no apenso de verificação e graduação de créditos, qualificou o crédito da recorrente como subordinado. Sendo assim, esta qualificação encontrava-se definitivamente fixada no processo, quer quando a proposta de distribuição e de rateio final foi elaborada, quer quando a decisão recorrida foi proferida. Logo, por um lado, aquela proposta cumpre inteiramente a sentença de graduação dos créditos reclamados e, por outro, estava vedado, ao tribunal a quo, alterar a qualificação do crédito da recorrente na decisão recorrida.

Contudo, para que não restem dúvidas, repetimos: ainda que assim não fosse, o recurso não poderia proceder, pela razão primeiramente referida.

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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente, sem prejuízo do decidido em matéria de apoio judiciário.

Notifique.

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Évora, 19.03.2024

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

(1.ª adjunta)

(2.ª adjunta)



[1] ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume V (reimpressão), p. 212.

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Acórdão da Relação de Évora de 08.02.2024

Processo n.º 5301/12.2TBPTM-M.E1

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Sumário:

A majoração estabelecida no n.º 7 do artigo 23.º do Estatuto do Administrador Judicial deve ser feita tendo por base a percentagem do valor dos créditos reclamados e admitidos que obtém satisfação.

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Insolvente: Sociedade 1, Lda..

Administrador da insolvência: AA.

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O administrador da insolvência interpôs recurso de apelação do despacho que fixou em € 40.648,41 o valor da parte variável da sua remuneração, tendo apresentado as seguintes conclusões:

A) Dando aqui por reproduzido tudo quanto anteriormente se disse, ao abrigo do princípio da economia processual, cumpre-nos balizar o presente recurso.

B) Pretende o recorrente ver esclarecida por este venerando tribunal a questão suscitada pelo despacho proferido pelo tribunal a quo, a saber:

1 – Andou bem o tribunal a quo na interpretação e aplicação do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do Estatuto dos Administradores Judiciais, isto é, ao determinar que a majoração dos 5% deverá ser calculada sobre a percentagem dos créditos satisfeitos e não sobre o montante dos créditos satisfeitos?

2 – O quociente entre o resultado da liquidação e o total dos créditos admitidos corresponde ao grau de satisfação dos credores ou ao grau médio de satisfação dos credores?

Posto isto,

C) Parece-nos de suma importância que este tribunal clarifique o correcto cálculo da majoração da remuneração variável do administrador da insolvência, nos termos do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do EAJ, de acordo com a sua nova redacção, conferida pela Lei n.º 9/2022, de 11.01.

D) Porquanto, desde a entrada em vigor da Lei n.º 9/2022 que o recorrente tem sido notificado de despachos sobre a proposta de cálculo da remuneração variável distintos, isto é, despachos que aplicam diferentes formas de cálculo – uns calculam 5% de majoração sobre o montante dos créditos reclamados, admitidos e satisfeitos, já outros, como é o caso sub judice, calculam 5% sobre a percentagem dos créditos reclamados, admitidos e satisfeitos.

E) Ou seja, decisões díspares, com valores totalmente distintos, que o recorrente tem sido notificado. Vivendo na incerteza quanto ao valor da remuneração variável que auferirá em cada processo.

F) O que, sem prejuízo de causar frustração da expectativa do recorrente, no plano abstracto e geral provoca grave incerteza jurídica no que concerne à remuneração do administrador judicial no ordenamento jurídico português, daí a importância do douto esclarecimento que se almeja com o presente recurso.

G) Resultando assim que a única inovação da norma foi “(…) em 5% do montante dos créditos satisfeitos, sendo o respectivo valor pago previamente à satisfação daqueles.”

H) Ou seja, a inovação na norma nada refere que o cálculo tenha de ser efectuado sobre a percentagem de créditos satisfeitos, o que diz, ipsis verbis, é que a majoração é de 5% do montante dos créditos satisfeitos.

I) Pelo que, se recorrermos à interpretação literal da norma, advogamos que o que a letra da lei nos diz é que a majoração dos 5% deverá ser calculada sobre o montante dos créditos satisfeitos – a interpretação do recorrente.

J) E não sobre a percentagem dos créditos satisfeitos – interpretação do tribunal a quo.

K) Através da função negativa, de exclusão, é colocada de parte a interpretação do tribunal a quo que determina o cálculo da majoração de 5% sobre a percentagem dos créditos reclamados, admitidos e satisfeitos.

L) Uma vez que a letra da lei refere “5% do montante dos créditos satisfeitos”.

M) E, caso o legislador quisesse dizer 5% da percentagem dos créditos satisfeitos, certamente o teria escrito, não sendo esse o caso.

N) Posto isto, não pode o recorrente defender uma posição ou, no caso, conformar-se com uma interpretação que não tem base de apoio na letra da lei.

O) Por outro lado, se atendermos à função positiva do elemento literal na interpretação, entendemos que o legislador, ao escrever “5% no montante dos créditos satisfeitos”, referia-se, tão-somente, a montantes, isto é, valores, importância, ou quantia a distribuir pelos credores, nunca a percentagem a distribuir pelos credores.

P) Sendo certo que a palavra montante, na linguagem corrente ou, ainda, na linguagem jurídica, não é utilizada como sinónimo de percentagem.

Q) A Lei n.º 9/2022 transpõe a Directiva (UE) 2019/1023, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20.06.2019, e, consequentemente, altera o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o Código das Sociedades Comerciais, o Código do Registo Comercial e legislação conexa, tal como o Estatuto dos Administradores Judiciais.

R) E, se há expressão que podemos usar no que se refere a esta Directiva, é a prossecução da eficácia nos processos de recuperação ou de insolvência.

S) Razão pela qual, a Directiva impõe aos Estados-Membros que exijam aos profissionais do domínio da reestruturação, isto é, administradores judiciais, formação e conhecimentos técnicos específicos. Assim como, imponha a fiscalização à actividade daqueles, tudo isto conforme se retira dos considerandos 87 e 89 e, ainda, dos artigos 26.º e 27.º daquela Directiva.

T) No entanto, a Directiva vinca que os serviços prestados pelos administradores judiciais deverão sê-lo “(…) de modo imparcial e independente”.

U) Acrescentando, no n.º 4 do artigo 27.º, que “Os Estados-Membros asseguram que a remuneração dos profissionais se reja por regras que sejam compatíveis com o objectivo de uma resolução eficiente dos processos.

V) Ou seja, o espírito da Directiva não é piorar as condições de remuneração dos administradores judiciais, pessoas das quais, em bom rigor, a eficiência do processo depende.

W) Assim como depende dos seus conhecimentos técnicos.

X) Pelo que não se concebe que a alteração da lei que venha degradar as condições de remuneração dos administradores judiciais, quando o que a Directiva pretende é criar maior incentivo à gestão eficaz do processo por parte daqueles intervenientes e a sua actuação isenta e imparcial.

Y) Relembrando que os administradores judiciais regem o património das massas insolventes durante anos, o que facilmente poderá alcançar as largas centenas de milhares de euros ao ano.

Z) Portanto, quer-nos parecer que o espírito da lei deverá ser a criação de fiscalização rigorosa e, de mãos dadas, o aumento da remuneração variável como um incentivo à eficiência, diligência e seriedade dos administradores judiciais.

AA) A este propósito, é interessante a abordagem do Sr. Dr. Nuno Marcelo de Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo, juiz de direito da comarca de Aveiro do 1.º Juízo do Comércio de Anadia, in “A remuneração do administrador judicial e a sua apreciação depois de 2022”, publicado pela Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais, que salienta a dignificação do exercício de funções dos administradores judiciais como um dos critérios aos quais se deve recorrer para interpretar as alterações introduzidas pela Lei n.º 9/2022: “(…) tem de salientar-se, negativamente, que a remuneração fixa prevista para o administrador da insolvência, no valor de € 2000 por processo, introduzido pela Portaria 51/2005, de 20.01, está já em vigor desde que, em 2024, teve início a aplicação no tempo do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante, CIRE). Ou seja, durante cerca de vinte anos, o valor da remuneração fixa não foi objecto de qualquer aumento ou actualização. Mais, a situação agravou-se tendo em conta o valor tabelar das despesas do administrador, que em 2004 era de € 500 (art. 26.º/6 da Lei 32/2004, de 22.07, e artigo 29.º/8 do EAJ com a redacção original, e diminuiu para apenas 2 UC com as modificações introduzidas pelo Decreto-Lei 52/2009, de 17-4, no artigo 29.º/ 8 do EAJ, não sofrendo qualquer alteração com a Lei n.º 9/2022, de 11-1. No entanto, com o aparente propósito de compensar tal estagnação, para nós injustificada, o legislador optou agora para aumentar significativamente a componente variável da remuneração do AJ, o que, portanto, decidiu fazer à custa das massas insolventes, dos credores e, nos processos de recuperação, revitalização e para acordo de pagamentos, dos devedores.” (pg 4-5)

BB) Na mesma publicação, o autor interpreta o cálculo a que o n.º 7 do artigo 23.º do EAJ faz alusão, dizendo: “A nosso ver, a sua aplicação requer as seguintes operações:

I) Apuramento do resultado da liquidação (n.º 6) nos termos tradicionais, i. é, o valor das receitas obtidas, deduzido das despesas e dívidas da massa insolvente e das custas resultantes de processos instaurados após a insolvência, mas, como se disse, sem considerar a remuneração fixa;

II) Aplicação da percentagem de 5% sobre esse resultado; e

III) Majoração de mais 5% sobre o valor pronto para distribuição.

A respeito deste último momento da operação, o n.º 7 do preceito legal refere “5% do montante dos créditos satisfeitos”, mas parece evidente que usou a expressão sem qualquer rigor, porque se aumenta o valor da remuneração variável, à custa das disponibilidades da massa insolvente, já não estamos, obviamente, nessa mesma medida, na presença de “créditos satisfeitos”.

Assim sendo, o que a lei parece pretender referir, para a majoração da remuneração variável em caso de liquidação, é a aplicação de novo factor de 5% sobre o valor pronto para distribuição, “limpo”, totalmente líquido, que seria destinado ao pagamento dos créditos, mas que vai ser retirado desse destino para majorar a remuneração do AI, quase como se este fosse um credor.

E assim se compreende que o n.º 7 determine, na verdade de forma perfeitamente desnecessária, face à precipuidade das dívidas da massa, que o respectivo valor “é pago previamente à satisfação” dos credores.

Em suma, pensamos que estes 5% da majoração vão incidir sobre o produto da liquidação já deduzido de todas as despesas da massa, incluindo a remuneração fixa e variável (esta, naturalmente ainda sem a majoração).

Crendo-se que esta majoração não constitui outros 5% sobre o valor da liquidação, primeiro porque a forma de apuramento é distinta, nos termos do n.º 7, e igualmente porque de outro modo não se compreenderia que o legislador não tivesse logo estabelecido o valor de 10% sobre o resultado da liquidação.

Por outro lado, daqui resulta, em conjugação com o disposto no art. 30.º do EAJ, que a remuneração fixa e remuneração variável do AJ em processo de liquidação estão sempre garantidas; ao invés, como se disse, no PER e no PEAP, nenhuma das duas está verdadeiramente assegurada ao AJ. Finalmente, a nova fórmula de cálculo da remuneração variável em caso de liquidação, e ao contrário do que a letra do n.º 7 parece sugerir, implica a total irrelevância que o grau (ou percentagem) de satisfação dos credores assume agora, face ao universo da totalidade dos créditos.” (pg. 32-33)

CC) Assim como, o que já foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no acórdão datado de 20.09.2022, processo n.º 9849/14.6T8LSB-E.L1 no sentido dos 5% da remuneração variável serem calculados sobre a quantia efectiva de créditos satisfeitos e não sobre a percentagem de créditos satisfeitos.

Mais

DD) Estamos diante de um valor de liquidação do activo de € 990.851,67 e, ao interpretar o artigo 23.º, n.º 7, do EAJ como o tribunal a quo fez, resulta que o administrador judicial receberá menos que a percentagem que os vendedores imobiliários cobram por, apenas, a venda de um imóvel.

EE) Apesar de os deveres e responsabilidades do administrador judicial serem imensuravelmente superiores aos dos vendedores de imóveis.

Ademais,

FF) Com a interpretação que o tribunal a quo faz parece pretender imputar o ónus ao administrador judicial da quantidade de créditos existentes sobre cada massa insolvente.

Repare-se:

GG) Dois processos de insolvência (A e B) em tudo similares quanto ao objecto e valor da liquidação (por exemplo: dois imóveis) de que resultou um montante de € 100.000 em cada um;

HH) No processo A, porém, o valor dos créditos aprovados é de € 200.000 (por exemplo: crédito hipotecário), logo o grau de satisfação é de 50%;

II) No processo B, o valor dos créditos aprovados é de € 400.000 (por exemplo: crédito hipotecário em tudo similar ao do outro processo, mas em que existam outros créditos), logo o grau de satisfação é de 25%;

JJ) No processo A, a segunda parte da remuneração variável seria de cerca de € 2.500;

KK) No processo B, a segunda parte da remuneração variável seria de cerca de € 1.250.

LL) Ou seja, o resultado das diligências do administrador da insolvência seria remunerado de forma substancialmente diversa, apesar do trabalho desenvolvido e do trabalho obtido serem exactamente os mesmos, e isso pela simples circunstância de existirem créditos aprovados diferentes, claramente, não parece que seja esse o objectivo do legislador.

MM) Acaso pode o AJ controlar o passivo dos devedores que são declarados insolventes?

NN) Pelo que, também por estes motivos, não se pode aceitar a interpretação do tribunal a quo da norma em crise.

OO) Porquanto, a interpretação do tribunal a quo não só não dignifica as funções de administrador judicial, como não promove ou incentiva o exercício exímio daquelas funções, com empenho máximo – o que é contraproducente, como, cremos, facilmente se alcança.

PP) Por fim, o quociente entre o resultado da liquidação e o total dos créditos admitidos não corresponde ao grau de satisfação dos credores, mas sim ao “grau médio de satisfação dos credores”.

QQ) Ou seja, podem coabitar credores com satisfação integral dos seus créditos com credores sem qualquer satisfação dos seus créditos.

RR) O que suscita a questão de saber se a expressão “dos credores” se refere a todos ou somente àqueles que serão ressarcidos (total ou parcialmente).

SS) Logo, parece-nos claro que a melhor e mais adequada medida do “grau de satisfação dos credores” corresponde ao montante absoluto em valor que será distribuído pelos credores (grosso modo, o produto da liquidação).

TT) Com efeito, somente o numerador daquele quociente pode ser, eventualmente, potenciado pelo empenho e diligência do AJ. O denominador não depende, em circunstância alguma, da intervenção do AJ.

UU) Ora, querer associar, por via do tal grau médio de satisfação dos credores, à medida do desempenho do AJ, não faz qualquer sentido.

VV) O produto da liquidação será, pois, na falta de melhor indicador, aquele que melhor se poderá associar à medida do desempenho do AJ.

WW) Finalmente, uma breve referência à circunstância das custas judiciais serem apuradas exactamente por referência ao produto da liquidação, sem quaisquer preocupações com a satisfação ou não dos credores.

XX) Posto isto, está em causa o princípio da segurança e certeza jurídicas quanto à remuneração variável dos administradores judiciais, bem como da dignidade das funções de administrador judicial, tal como tem vindo a ser defendido por este tribunal da relação, designadamente nos acórdãos supra referenciados dos processos números 3454/20.5T8STS-K.P1 e 1024/10.5TYVNG-N.P1. 

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido.

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Questão a resolver: Fórmula de cálculo da majoração prevista no n.º 7 do artigo 23.º do Estatuto do Administrador Judicial (EAJ).

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O n.º 7 do artigo 23.º do EAJ estabelece, na parte que nos interessa, que o valor alcançado por aplicação das regras referidas nos n.ºs 5 e 6 é majorado, em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5% do montante dos créditos satisfeitos.

A redacção desta norma não é feliz. Estabelece-se que a majoração se faz em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, mas, logo a seguir, também se estabelece que a majoração deverá ser de 5% do montante dos créditos satisfeitos. Trata-se de realidades diferentes. O grau de satisfação dos créditos é evidenciado pelo confronto entre o montante dos créditos reclamados e admitidos e a parte desses créditos que obtém satisfação. O montante dos créditos satisfeitos é apenas um dos termos da relação que exprime o grau de satisfação dos créditos. Daí os problemas interpretativos que a norma vem suscitando.

O entendimento do tribunal a quo é o de que «o grau de satisfação dos créditos reclamados não poderá ser ignorado. Ainda que as expressões utilizadas pelo legislador não tenham sido as mais esclarecedoras, o que está em causa, fundamentalmente, é a majoração e a dependência “do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos”. (…) Considerando o teor literal do preceito, que faz expressa referência ao “grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos” e porquanto se entende que o legislador não teve intenção de abandonar o princípio já vigente de que a majoração da remuneração variável dependeria do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos (…) entendo que não poderá desconsiderar-se a proporção dos créditos efectivamente satisfeito, face aos créditos reclamados e admitidos.»

O recorrente discorda deste entendimento, sustentando que «a majoração dos 5% deverá ser calculada sobre o montante dos créditos satisfeitos», sem se ter em conta o grau de satisfação desses créditos.

Quer o relator, quer os adjuntos, tomaram anteriormente posição coincidente com a do tribunal a quo – acórdãos da Relação de Évora de 14.09.2023 (Vítor Sequinho dos Santos), de 20.04.2023 (Anabela Luna de Carvalho) e de 30.03.2023 (Francisco Matos, o qual também subscreveu, como adjunto, o acórdão referido em primeiro lugar). Também assim decidiu o Supremo Tribunal de Justiça no acórdão do de 18.04.2023 (Maria Olinda Garcia) e vem sendo decidido unanimemente neste Tribunal da Relação – acórdãos de 29.09.2022 (Tomé de Carvalho), 15.12.2022 (Maria Domingas Simões), 02.03.2023 (Maria Domingas Simões), 30.03.2023 (Isabel de Matos Peixoto Imaginário), 30.03.2023 (Tomé de Carvalho), 20.04.2023 (Maria Domingas Simões) e 11.05.2023 (José Manuel Barata).

O entendimento segundo o qual os 5% de majoração devem ser calculados directamente sobre o montante em que os créditos são satisfeitos implica considerar não escrito o trecho do n.º 7 do artigo 23.º do EAJ que estabelece que a retribuição do administrador judicial é majorada em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos. Majorar-se esta parcela da retribuição variável em função do montante em que os créditos reclamados e admitidos são satisfeitos, sem mais, implicaria a negação do critério do grau de satisfação desses créditos. O resultado da majoração seria sempre o mesmo, independentemente de os créditos serem satisfeitos em 100%, em 50%, em 10%, ou em qualquer outra proporção.

Daí que tal interpretação do n.º 7 do artigo 23.º do EAJ deva ser afastada. A interpretação correcta desta norma, que tem em conta a sua teleologia, é aquela segundo a qual a majoração deve ser feita tendo por base a percentagem do valor dos créditos reclamados e admitidos que obtém satisfação.

O entendimento que acabámos de expor não é abalado pela argumentação do recorrente.

O recorrente afirma que, caso o legislador quisesse dizer 5% da percentagem dos créditos satisfeitos, certamente o teria escrito, não sendo esse o caso”. O contra-argumento é óbvio: caso o legislador pretendesse que a majoração fosse de 5% do montante dos créditos satisfeitos, não teria estabelecido que ela deve ser feita em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos. Entre os dois segmentos aparentemente contraditórios do n.º 7 do artigo 23.º do EAJ, a solução tem de ser encontrada com recurso à teleologia da norma, que é a de estimular o administrador judicial a esforçar-se no sentido de obter o maior grau de satisfação possível dos créditos reclamados e admitidos.

O argumento de que a Directiva (UE) 2019/1023, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20.06.2019, que a Lei n.º 9/2022 transpõe a ordem interna, tem um objectivo de prossecução da eficácia nos processos de recuperação ou de insolvência, apenas corrobora o nosso entendimento. Nesta perspectiva, eficácia consiste em assegurar o maior grau de satisfação possível dos créditos reclamados e admitidos, para o que a majoração da parte variável da remuneração do administrador judicial em função da percentagem de satisfação do conjunto dos créditos reclamados e admitidos constitui o melhor estímulo. Melhor, seguramente, que uma majoração feita exclusivamente em função do montante em que os créditos são satisfeitos, independentemente do grau dessa satisfação.

Não vemos em que medida o critério da majoração da parte variável da remuneração em função do grau de satisfação dos créditos ponha em causa a imparcialidade e a independência da actuação do administrador judicial. O próprio recorrente não fundamenta esta afirmação.

O argumento de que o critério seguido pelo tribunal a quo gera uma degradação das condições de remuneração do administrador judicial peca por falta de demonstração. Poderia, eventualmente, ser assim se a totalidade da remuneração fosse calculada de acordo com aquele critério. Mas não é isso que acontece.

A comparação, feita pelo recorrente, da remuneração do administrador judicial com a dos mediadores imobiliários, além de factualmente não sustentada, não tem razão de ser. Trata-se de funções distintas, exercidas sob enquadramentos jurídicos também distintos, pelo que a comparação é descabida.

O mesmo se diga do paralelismo que o recorrente faz entre a remuneração do administrador judicial e as custas judiciais. Não tem razão de ser, pura e simplesmente.

A argumentação constante das conclusões FF) a NN) não procede, pois foi opção deliberada do legislador que a majoração se faça em função, não da actividade do administrador judicial em si mesma, mas sim do resultado dessa actividade. Sendo este o critério de cálculo, as diferenças remuneratórias assinaladas pelo recorrente nada têm de anormal.

A argumentação constante das conclusões PP) a RR) também nada demonstra. Efectivamente, a referência, feita no n.º 7 do artigo 23.º do EAJ, ao “grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos”, reporta-se ao grau médio de satisfação dos credores. Não é possível outra interpretação, precisamente pela razão referida pelo recorrente na conclusão QQ).

Concluindo, o tribunal a quo decidiu acertadamente, pelo que a decisão recorrida deverá ser confirmada, improcedendo o recurso.

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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas a cargo do recorrente.

Notifique.

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Évora, 08.02.2024

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

Anabela Luna de Carvalho (1.ª adjunta)

Francisco Matos (2.º adjunto)


Acórdão da Relação de Évora de 19.03.2024

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